Tenho alertado os nossos Irmãos Maçons a respeito dos compromissos para com a comunidade em que nos encontramos, por ser aí que residimos ou em face de, no seu âmbito, se achar instalada a nossa Loja. Em ambos os casos, directa ou indirectamente, o Maçon tem a ver com essa comunidade, como qualquer outro cidadão o tem em iguais circunstâncias, devendo com ela contribuir para melhoria dos seus costumes e bem estar de todos os que ali habitam. Mais ainda, porque é para tornar felizes as pessoas que nós nos entranhamos de Maçonaria. Pelo menos este é o objectivo. E mesmo porque ao se beneficiar o todo, a parte do mesmo termina por usufruir desses benefícios.
Quando, nos meus artigos, me refiro à Maçonaria comunitária, quero tratar deste assunto. Digo que cada Loja deve ter o seu projecto e até pareço exagerar nestas referências. Entendo que é através desse instrumento que se põe em prática o que foi aprendido durante a formação templária, como também queo projecto estimulará a permanência do Maçon, por muito mais tempo, em actividade na Ordem. Basta constatar que a execução do projecto leva o Maçon a se envolver com ele, constituindo-se num desafio, seja pela sua condição de contribuinte dos meios, seja como dirigente.
E nestas condições, decerto, não serão regateados esforços para que a missão tenha pleno êxito.
Quero ressaltar, porém, que o envolvimento, tal como foi exposto acima, torna-se um facto circunstancial. Enquanto que o carácter de construtor social que se assume ao ser Iniciado Maçon, adverte-me que este envolvimento deve ser inerente. A construção social é o compromisso que o Maçon deve assumir não por obrigação (entendida aqui como um gesto forçado), mas sim por amor à realização do que lhe é devido. A filantropia que está na definição da Ordem, é o nome deste compromisso, sendo o seu exercício parte exotérica da vida do Maçon. Falhar para com ele nem pensar, dado que tal indiferença, todos sabemos, seria desonroso para o Iniciado.
“Amar ao próximo” foi um mandamento que se tornou evidente com o nascimento da civilização cristã e está catalogado entre as virtudes Maçónicas que nos são dadas a conhecer desde a passagem pelo “banco das reflexões”, claro que chamando a atenção para o facto de que a prática dessa virtude fará parte dos nossos dias, daí em diante, e por toda a vida. O apóstolo Paulo, ao escrever aos Coríntios, estabeleceu esta marca que a Maçonaria tomou como mote: “Ninguém busque o seu interesse, mas o do próximo”. (I Cor. 10, 24).
A mim parece-me que já se torna necessário à Ordem repensar o seu dicionário no tocante à expressão “amor fraternal”. É o “espírito do tempo” que exige isto. Os Estatutos das Potências estão cansados de repetir que a “Maçonaria é uma Instituição Iniciática, Filantrópica …” Mas já está na altura de ir mais além, explicitando que “filantropia” não é teoria, é prática e, como tal, absolutamente necessária, distinguindo-se de “caridade”, a qual, embora contida na filantropia, é de menor hierarquia.
Nos nossos dias, fazer caridade é dar uma esmola, isto é, colocar, por exemplo, algum dinheiro na bacia de um pedinte postado na cabeceira da ponte, ou servir um prato de sopa na calçada da sua residência a alguém que passa faminto, ou dar um velho e surrado cobertor a quem treme de frio, etc. Houve um tempo distante, mais de dois mil anos, em que a palavra “caridade” era sinónimo perfeito de pleno “amor ao próximo”, a ponto de ser uma das três virtudes teológicas. As duas outras eram a fé e a esperança, mas elas ambas subalternas à caridade (I Cor 13, 13).
Filantropia, nos tempos de hoje, ocupa um espaço mais amplo. É um estágio mais evoluído dessa caridade. Esse gesto de dar esmola, e não são poucos que o entendem assim, contribui para corromper os costumes. Já a filantropia não. É a contribuição não somente destinada a atender a carências imediatas, mas também e sobretudo o caminho para fomentar a melhoria das condições de sobrevivência seja de uma organização, seja de uma colectividade. É uma contribuição para o progresso, o qual também se inclui na definição da Ordem: iniciática, filantrópica, progressista… daí ser preciso e urgente reformar o nosso dicionário!
O projecto de filantropia é uma proposta da Loja. Não deve ser uma imposição do Venerável nem de qualquer Obreiro isolado. Pois, por seu significado e destinação, é um instrumento consensual.
Todos os membros da Loja deverão estar envolvidos. Será uma imensa Oficina. Tanto, que se me proponho a realmente ser um Construtor Social, tenho de me debruçar sobre esta nobre missão, conhecendo a minha comunidade e as suas carências, interpretando os seus sonhos, avaliando as suas possibilidades, estabelecendo prioridades, colaborando, enfim, com a pavimentação dos seus grandes caminhos. Se o quadro da Loja é de poucos Obreiros, juntem-se várias Lojas. Se já existe um projecto vitorioso na comunidade, procuremos associar-nos à iniciativa. Que a Loja não seja o limite, mas a vertente. Não esquecer de que antes, como agora, a Ordem é construir. Que à responsabilidade individual se sobreponha o compromisso colectivo da Oficina, e que este seja o “Orvalho do Hermon” da Maçonaria comunitária.
António do Carmo Ferreira
Grão-Mestre do GOI-PE – Or:. Recife – PE
Fonte: www.freemason.pt
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