O que queres que eu faça? A pergunta maçónica

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O que queres que eu faça? A pergunta maçónica

Certamente, já lhe perguntaram: “O que vindes fazer aqui?”

Muitas vezes já nos perguntámos: “O que eu vim fazer aqui?”

Estas perguntas acompanham-nos sempre, durante a nossa vida Maçônica.

Muitas e muitas vezes ouvimos alguém falar sobre este assunto.

Inúmeras vezes deparamo-nos com peças de arquitetura que abordam este tema, com muita propriedade. A cada pergunta dessas, há sempre uma reflexão imediata.

As nossas ações, o nosso comportamento e expectativas em Loja, na Ordem ou na Potência, estão sempre atreladas a estes questionamentos e tendem nos acompanhar-nos ao longo da nossa jornada maçônica.

A bem da verdade, nós estamos sempre lembrando-nos de que precisamos fazer uma Maçonaria mais operativa.

Quando falamos em Loja sobre a nossa aprendizagem, geralmente tocamos nesse assunto, e então falamos que viemos aqui, para fazer novos progressos na Maçonaria, vencer as paixões e submeter as nossas vontades.

É como se estivéssemos tentando reafirmar a nós mesmos, a nossa preocupação em fazer alguma coisa em Loja.

Uma autocrítica talvez?

Ou seria apenas uma forma de externar belas palavras e pensamentos através de uma boa oratória?

O facto é que nos orgulhamos ao dizer, todas as vezes aos nossos Irmãos, que sempre, antes de sairmos de casa, nos perguntamos: “O que vou lá fazer?”

Também dizemos que todas as noites, quando pisamos com o nosso pé esquerdo no templo, nos perguntamos: “O que eu vim fazer aqui?”

Ao falarmos aos nossos Irmãos sobre essas perguntas que nós fazemos, penso se estamos querendo mostrar-lhes o que realmente somos: Homens preocupados com o que viemos fazer aqui.

Será verdade? Será utopia?

Ou melhor! Será que a pergunta que devemos fazer é realmente esta: “O que eu vim fazer aqui?”

Sugiro, entretanto, que deveríamos dedicar algum tempo para pensarmos diferente.

Pensar em TRANSFORMAÇÃO!

E o “pensar diferente” e pensar em “Transformação”, bem que poderia requerer que fizéssemos uma viagem, numa espécie de túnel do tempo.

Retornando há quase dois mil anos atrás cujo destino nos leva para as proximidades de um oásis de excepcional beleza, no sopé de um monte chamado Hermon. Esta viagem, meus Irmãos, leva-nos à cidade encantada de Damasco.

Ao chegarmos lá, em algum dia entre os anos 31 e 36 da nossa Era Vulgar, logo avistamos as margens do Rio Bahada, com as suas águas abundantes, possibilitando vida àquela região. O dia está quente, aproxima-se o meio dia, e o sol forte castiga-nos o corpo. Não há vento e nenhuma folha nas árvores se mexe. O silêncio no local é quebrado apenas pelo canto dos pássaros.

Sentimos a boca seca e o corpo a desidratar devido à aridez.

Somos agora peregrinos… A andar naquela estrada sentindo o que é caminhar rumo a Damasco, vendo os pomares, os vinhedos, e logo podendo saciar a sede e descansar contemplando o deserto da Síria que limita a cidade ao Leste.

Inseridos neste contexto, vestimos as nossas túnicas de mangas volumosas amarradas na cintura por uma tira de couro (ou corda) e um manto, um quadrado de pano que além servir de cobertor, não deixa o sol escaldante queimar a nossa pele. As sandálias de couro de camelo protegem os nossos pés cansados, do calor daquela terra quente.

Sentamo-nos para descansar à sombra de uma oliveira, enquanto observávamos alguns camelos resignados, que se arrastavam pesadamente sob o sol de brasas. Repentinamente o estranho silêncio naquele local, começa ser quebrado pelo ruído longínquo do galope frenético de cavalos que rapidamente se aproximam trazendo com eles uma nuvem de poeira e fazendo a areia ardente tremer por onde passam.

No céu, estranhamente, formam-se algumas nuvens escuras, deixando a região com aquela espécie de mormaço amarelado e quase rosa, cujos raios de Sol entre elas são tão brilhantes que quase ofuscam quem os fite.

Como meros expectadores, ali sentados, vemos passar diante de nós o grupo de cavaleiros, tendo à frente, um homem altivo, evidenciando o aprumo de quem está habituado aos prazeres do desporto, bem montado num belo cavalo. Posta-se à frente do grupo em atitude dominadora.

É Saulo de Tarso! Gritou alguém de um grupo de peregrinos que caminhava no outro lado da estrada.

Sim era ele! Saulo de Tarso que se tinha tornado um grande inimigo da nova religião e dos seus seguidores.

Um homem que foi criado para ser um zeloso combatente dos vícios.

Um homem que só respira ameaças e morte contra os discípulos do Senhor.

Presenciamos o momento em que aquele cavaleiro, com expressão malvada, jamais imaginava acontecer: A TRANSFORMAÇÃO da sua vida.

Diante dos nossos olhos, uma cena rara e inusitada acontece durante a sua chegada nas proximidades de Damasco…

Vimos o animal, parar abruptamente, ficar inquieto a relinchar frenética e apavoradamente, levantando as patas dianteiras, com se estivesse vendo alguma coisa que o assustava muito.

Jacób!… Demétrio!… Socorram-me! – grita ele desesperadamente. Mas a confusão dos sentidos tira-lhe a noção de tudo naquela hora.

…Subitamente foi cercado por uma luz resplandecente vinda do céu. Caindo por terra, ele ouviu uma voz que lhe dizia: “Saulo, Saulo, por que me persegues?”. Saulo então diz: “Quem és, Senhor?”.

Respondeu Ele: “Eu sou Jesus, a quem tu persegues.”

Trémulo e atónito, disse Saulo: “Senhor, que queres que eu faça?”.

Respondeu-lhe o Senhor: “Levanta-te, entra na cidade. Ali te será dito o que deves fazer”.

Então, vimos o orgulhoso e inflexível doutor da Lei curvar-se para o solo, em pranto convulsivo.

Pensamos então, após a cena que assistimos… Se Saulo retrocedesse naquele caminho, negando a sua experiência, resistindo a Cristo, jamais poderia ter sido Paulo.

Saulo, contudo, é convertido, tornando-se Paulo de Tarso. Deixou de ser aquele homem duro, rigoroso, ameaçador e violento e passou a demonstrar ternura, sensibilidade e amor. Características evidentes nas suas obras.

Agora ele via de uma maneira diferente, era um homem transformado. Mas, foi necessário, “ENTRAR NA CIDADE”.

A nossa visão do ocorrido, daquela queda do cavalo e a forte luz que o cegou, fez-nos lembrar as nossas alegorias e representaram, naquele momento, a morte na vida profana. Ao mesmo tempo, a luz que o cegou, representava o renascimento de um homem para uma nova vida.

A alegoria com o caminho de Damasco representa todo o processo de conversão e transformação.

Através dessa historia pode-se descrever a vida do velho e do novo homem.

Entreolhamo-nos boquiabertos, quase incrédulos por vivenciarmos esta cena e participarmos desta viagem.

Já recompostos do espanto em que tínhamos sido levados por aquele cenário vamo-nos afastando do local caminhando lentamente, em profundo silêncio, até que sumimos no horizonte empoeirado, como se este, fosse um portal. E ao desaparecermos na nuvem de poeira, pouco a pouco retornávamos do passado distante.

E então, meus Irmãos, ao voltarmos da nossa viagem, trouxemos connosco um exemplo de resignação, mudança, transformação e atitude e o exemplo de como um coração endurecido, muda diante da Força, da Luz, do Poder e da Vontade do Grande Arquitecto do Universo.

Aprendemos que, para nós, Maçons, é preciso “ENTRAR NO TEMPLO”, assim como Saulo, precisou ENTRAR EM DAMASCO, para deixarmos de ser o velho, e nos tornarmos um novo homem.

Trazemos connosco a certeza de que o resultado daquela experiência de conversão na qual Saulo veio a conhecer Cristo foi uma COMPLETA TRANSFORMAÇÃO.

Voltamos para as nossas casas com a sensação de que uma nova pergunta deve ser feita ao sairmos de lá e colocarmos nosso pé esquerdo no interior do templo.

Nesta hora pensaremos em TRANSFORMAÇÃO e não mais: “O que eu vim fazer aqui?”.

Perguntaremos: O QUE QUERES QUE EU FAÇA?

Ao fazermos esta pergunta, estaremos saindo do costumeiro e muito decorado “Vencer as minhas paixões” para olharmos o outro, sairmos do Egoísmo e então, nos municiarmos de CORAGEM para nos doarmos, num mundo em que só se pensa em receber….

Ao fazermos mais uma vez esta mesma pergunta, estaremos questionando-nos sobre a VERDADE. A verdade sobre o nosso caminhar como Maçons.

Esta verdade pode ser aquela que estava com Saulo, no Judaísmo – Arrogante e impiedosa. Ou poderá ser para nós Maçons, a busca para a reforma intima ou eliminação das nossas vaidades efémeras.

Saulo fica cego, mas a sua visão reestabelece-se. Afinal, meus irmãos, ver e enxergar são conceitos distintos.

Ver remete-nos para a reflexão, vivência e compreensão. Do outro lado, enxergar é algo físico, do corpo.

A Luz que recebemos do Grande Arquitecto do Universo, na nossa iniciação, muitas vezes faz-nos cegar.

Ao invés de vermos, tal como Paulo, passamos apenas a enxergar, quase que cegamente, a Maçonaria como a Verdade, como um privilégio e muitas vezes perdemos a nossa capacidade de renascer em cada acção.

Esta peça, as alegorias, a viagem, o jogo de frases passa a ser um convite ao trabalho e a sairmos do egocentrismo para começarmos a escutar e aprender com o outro.

A ideia de “ENTRAR NA CIDADE”“ENTRAR NO TEMPLO” tem por objectivo explorar mais o nosso lado físico. Pois, a cada novo dia, somos convidados a “ENTRAR NO TEMPLO” e reconhecer as nossas falhas, dialogar com elas em união e também no nosso íntimo. Na nossa consciência.

Creio que assim, entenderemos melhor o nosso papel dentro da Ordem. Entenderemos melhor o nosso propósito, e quem sabe, possamos entender melhor o verdadeiro significado do Amor Fraternal

Podemos fazer mais! Podemos fazer melhor!

A começar pelos nossos Irmãos em Loja quando ao invés de lhes perguntarmos: “O que vindes fazer aqui?” Poderemos perguntar: “Irmão, o que queres que eu faça?”

Pensem nisso! Enquanto lhes digo: (…) Ser transformado inclui esquecer “o caminho percorrido” e ansiar “pelo que está à frente”.

Elson Luis de Oliveira Streb (M∴ M∴)
A∴ R∴ B∴ L∴ S∴ Cavaleiros da Luz nº 205 – GRANDE ORIENTE PAULISTA

Bibliografia

  • Paulo e Estevão – Romance de Emmanuel – Psicografado por Francisco Cândido Xavier – Federação espírita Brasileira – FEB – 45ª Edição – 6ª impressão – 7/2014;
  • Os Mensageiros – Uma história real sobre a presença dos Anjos, o apóstolo Paulo e Jesus Cristo – Julia Ingram e G.W. Hardin – Editora Sextante 1998;
  • Evangelho Segundo o Espiritismo – LAKE – Livraria Allan Kardec Editora – Tradução de J. Herculano Pires;
  • Bíblia Sagrada;
  • Ritual do Aprendiz Maçom – R∴ E∴ A∴ A∴ do Grande Oriente Paulista – edição 2002 – Iniciação do Aprendiz Maçom;

Fonte: freemason.pt

By | 2019-12-19T17:56:21-03:00 dezembro 23rd, 2019|Notícias|Comentários desativados em O que queres que eu faça? A pergunta maçónica