Nos círculos de gestão de pessoas, quando o assunto é motivação, ainda é possível ouvir-se uma velha lenda segundo a qual uma pessoa entra num jardim onde dois homens trabalhavam na jardinagem. Querendo perceber o estado de espírito de cada um, o homem aproximou-se do mais próximo e perguntou-lhe o que estava a fazer.
O homem respondeu com outra pergunta:
– Não vê que eu estou a cortar os ramos das árvores?
Da mesma forma, com o mesmo tom e com as mesmas palavras, repetiu a pergunta para o segundo jardineiro tendo obtido a seguinte resposta:
– Estou a preparar este jardim para que ele sirva de fonte de paz, de inspiração e de harmonia para todas as pessoas que visitarem esta casa.
Fisicamente, ambos podavam as plantas, mas espiritualmente um estava muito aquém da poda enquanto que o outro estava muito além. O primeiro cumpria com a sua obrigação; o segundo buscava um objectivo voltado para a satisfação das pessoas.
Por certo, ambos recebiam a mesma remuneração… A diferença entre uma resposta e outra está no estado de espírito com que cada um está executando a sua tarefa. Ao primeiro falta entusiasmo; ao segundo o entusiasmo abunda.
Entusiasmo, segundo o dicionário, é uma palavra que vem do grego enthousiasmós que leva à ideia de êxtase e, na medida que se aproxima dos tempos actuais, passa pelo sentido de veemência, vigor, flama, exaltação. Para Caudas Aulete, um dos conceitos é “Sentimento caloroso de adesão a uma ideia, tarefa, trabalho etc., que leva ao optimismo e a uma actuação enérgica e dedicada”. Mas, quando regredimos no tempo, o conceito ganha sentido místico e é entendido como transcendência e chega até ao seu sentido original que seria Deus em si. O próprio Caudas Aulete assim define: “Em religiões pagãs da Antiguidade, estado de exaltação emotiva de quem recebia de um deus o dom da profecia”.
Na mesma linha, Aurélio diz-nos que é “exaltação ou arrebatamento extraordinário daqueles que estavam sob inspiração divina, como as sibilas, etc.; transe, transporte”.
Num conceito materialista, entusiasmo é força, garra, disposição, dedicação, fervor. Num conceito mais para a metafísica, entusiasmo está ligado a um estado de espírito que impele a pessoa a obter sucesso nos objectivos por ele perseguidos. Ao admitir no conceito a ideia de Deus em si (gr. En + theos = em Deus) os conceitos físicos são potenciados por força transcendental e ganham o poder de alcançar os objectivos.
O segundo jardineiro consegue encantar as pessoas que entram no jardim e desarmá-los de quaisquer ânimos que atrapalhem a harmonia; já o primeiro, corta os ramos, apenas corta os ramos e nem sequer leva à planta os benefícios da poda.
A loja é a célula da maçonaria, instituição secular para uns, milenar para outros, mas uma instituição que na nossa era produz bons frutos. É uma organização voltada para paz, a concórdia, o desenvolvimento intelectual e moral do ser humano. Por si só isto já é um bem grandioso para a humanidade.
Como célula, a loja encerra em si todo gene da maçonaria seguindo a orientação que vem da sua potência. (É lamentável dizer que vem da sua potência para deixar claro que há mais de uma potência, o que nos desperta a certeza de que houve cisões o que para nós é um paradoxo posto que cisão e maçonaria não se combinam). Mas a loja desenvolve a actividade celular da sua potência.
Se perguntarem o que vimos aqui fazer, a nossa resposta não pode ser como a do primeiro jardineiro que, se estivesse em loja, limitar-se-ia a proceder a leitura de um ritual como se estivesse a mostrar à professora que já sabe ler palavra por palavra, sem contudo se preocupar com o significado de cada uma. As palavras estão no ritual mas o timbre de voz, a eloquência, está no coração de quem as lê e é o coração que dá vida à palavra. Desta forma a gente convence-se do que está dizendo e, findos os trabalhos de loja, imediatamente têm de se iniciar os trabalhos de maçonaria, a busca de uma sociedade melhor. Aos vícios opõem-se ora com uma orientação, ora com um conselho, ora com uma denúncia. As virtudes, essas merecem um templo que se ergue a cada assentimento, a cada elogio, a cada recomendação, a cada ajuda.
É preciso entusiasmo nos trabalhos de loja posto que só as pessoas entusiasmadas são capazes de vencer desafios do cotidiano. E por quotidiano devemos entender as vinte e quatro horas do dia. Logo, o quotidiano está no nosso trabalho, na nossa família, no nosso desporto ou lazer.
O entusiasmo é contagiante: Quando se lê o ritual de tal forma que convencemos de que se tem de tornar realidade aquilo que está a ser lido, convence também o irmão que o está ouvindo. Daí o verbo entusiasmar que significa provocar entusiasmo em alguém. Mas como transmitir calor se se está frio? Só é capaz de entusiasmar aquele que está cheio de entusiasmo. E neste caso específico, não dá para enganar. Bater palmas, gritar “vamos à luta”, sem entusiasmo, é muito pouco ou quase nada.
A loja precisa de entusiasmo até por uma questão de sobrevivência: Honoré Balzac teria dito que “O homem começa a morrer na idade em que perde o entusiasmo”. Isto é plenamente aplicável à loja. O marasmo da repetição semanal de um texto que não nos instiga à luta não deixa de ser uma morte lenta e gradual.
Precisamos de entender o texto do ritual na sua acepção lendo na mesma entonação de quem o escreveu para ter nele o real significado da maçonaria. Nem tudo será fácil, nem toda batalha vitoriosa, mas vale a pena acreditar na afirmação de Winston Churchill quando disse que “o sucesso é ir de fracasso em fracasso sem perder entusiasmo”.
E, como começamos com a alegoria num jardim, nesta mesma linha permitimo-nos dizer que, se um ou outro galho descompõe o jardim, quebra a harmonia, opõe obstáculos, obsta o entusiasmo, há de ser podado.
Derildo Martins da Costa – ARLS Luz do Planalto Or∴ de Serra – ES
Fonte: freemason.pt
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